A preocupação mais recente, no mundo, em relação ao novo coronavírus está relacionada ao surgimento das novas variantes.
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Na verdade, já existem inúmeras variantes circulantes, mas sem diferenças significativas. Essas variantes são resultantes do acúmulo de mutações dentro do mesmo genoma e são identificadas através do sequenciamento genético em laboratório. Principalmente em casos de pandemia, esse rastreamento do vírus circulante através do sequenciamento do seu genoma é fundamental para entender a circulação do vírus e agir adequadamente no caso de novas variantes.
Apesar dos termos “mutação” e “nova variante” trazerem medo à maioria da população, eles são rotina na pesquisa dos cientistas. Mutações são alterações no código genético e fazem parte do processo natural evolutivo de todo organismo, seja ele um vírus, uma planta ou um animal, incluindo o homem.
Mas enquanto nós levamos uma vida inteira para gerar poucos descendentes, um único vírus pode gerar milhões de novas partículas virais, por dia, quando dentro de uma célula hospedeira. Nesse processo de replicação, alguns nucleotídeos, unidades químicas fundamentais do nosso material genético (aquelas letrinhas A, C, G, T, U que estudamos na escola um tempinho atrás, lembra?), podem ser trocados por um erro das enzimas responsáveis por essa cópia do genoma viral. Essas alterações são aleatórias e, na maioria das vezes, trazem desvantagens para o vírus ou são irrelevantes. Mas acontecem algumas mudanças que favorecem o vírus de forma significativa, dando-lhe alguma vantagem em relação aos outros vírus produzidos juntos com ele, como uma maior capacidade de disseminação, por exemplo. Como a replicação do vírus é muito rápida e gera inúmeras cópias, muitas mutações possíveis ocorrem dentro de um mesmo indivíduo infectado. Assim, quanto mais um vírus circula numa população, mais ele se multiplica, aumentando as chances de aparecerem mutações vantajosas para ele.
Por fazer parte do processo natural evolutivo dos vírus, principalmente os que possuem RNA como genoma, as mutações e consequentes variantes já eram esperadas pela comunidade científica. A frequência e velocidade com que isso aconteceria iria depender do grau de transmissão do vírus na população. Está aqui uma das consequências da circulação descontrolada do vírus em uma população: a maior probabilidade de ocorrerem mutações que o favoreçam.
No início da pandemia, em janeiro de 2020, uma mutação relevante, D614G, surgiu na China e resultou na variante que se espalhou rapidamente pela Europa e Nova York, tornando-se, poucos meses depois, dominante em todo o mundo.
Hoje, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), temos 3 variantes mais importantes e que estão sendo investigadas com cuidado. São as chamadas variantes do Reino Unido (B.1.1.7), da África do Sul (B.1351 ou 501Y.V2) e a do Brasil (P1).
Essas variantes acumulam várias mutações, mas duas delas têm merecido atenção especial por conferirem vantagens relevantes ao vírus frente à pandemia: a N501Y e a E484K. As três variantes apresentam estas duas mutações.
A mutação N501Y parece fortalecer a interação entre as nossas células e a proteína S (spike), uma proteína da superfície do vírus que é responsável por se ligar às células humanas e conseguir invadi-las. Esta mutação pode facilitar a entrada do coronavírus nas nossas células, além de deixar estas novas variantes mais contagiosas ou mais transmissíveis. A mutação E484K parece conferir ao vírus uma capacidade maior de escapar do nosso sistema imune, pois os anticorpos são menos eficazes em se prender à partícula viral e impedir a sua entrada nas células.
Resumindo, as novas variantes prevalentes do Sars-CoV-2 se ligam mais fortemente aos receptores das nossas células tornando sua infecção mais eficiente, além de conseguirem escapar mais facilmente da ação do nosso sistema imunológico. Essas mudanças provocaram vantagens aos vírus e uma melhor adaptação ao homem, se espalhando mais rapidamente e aumentando a pressão sobre o sistema de saúde já muito sobrecarregado.
A primeira dessas variantes a trazer preocupação às autoridades de saúde, epidemiologistas e virologistas no mundo foi a B.1.1.7, identificada primeiramente no Reino Unido, em setembro, mas já presente em diversos outros países, inclusive aqui no Brasil. A mutação E484K, conhecida como Erick, foi identificada recentemente nesta variante.
Estudos preliminares apontam que a variante britânica não causa maior gravidade na doença ou um número maior de mortes, mas que pode ser até 70% mais contagiosa.
A mutação Erick parece também conferir um aumento na carga viral, o que permitiria a pessoa liberar uma maior quantidade de vírus no ambiente e, consequentemente, infectar uma maior quantidade de pessoas. Ou seja, uma maior carga viral estaria relacionada a uma maior transmissibilidade.
A variante brasileira P1, identificada primeiramente no Amazonas e já identificada em vários outros estados, confirma o impacto dessas mutações no curso da pandemia. Uma análise de 500 amostras de pacientes Covid-19 positivos, em Manaus, mostrou que a P1 tem ao menos o dobro de carga viral em relação às outras. E isso explica, em parte, o aumento mais rápido de casos de coronavírus presenciados atualmente no Brasil.
Apesar das evidências das características das novas variantes, a comunidade científica aponta outro motivo que acelera o quadro de novas ondas mundiais de infecção: estes vírus são realmente significativamente mais transmissíveis ou apenas estão sendo muito mais transmitidos? Ou seja, não será o comportamento das pessoas em não seguir os protocolos de biossegurança que está levando a um aumento expressivo dos casos de covid com essas variantes? Por algum motivo, as pessoas ainda não fazem uso de máscara e álcool em gel, continuam se aglomerando e ignorando o distanciamento social.
Mesmo após mais de 1 ano de pandemia, a cada resposta encontrada outras tantas perguntas são feitas. E talvez a mais inquietante e urgente no momento seja o quanto essas variantes são sensíveis às vacinas atualmente utilizadas contra o novo coronavírus.
A mutação Erick, como já disse, altera exatamente a proteína da superfície do vírus conhecida como Spike, podendo fazer com que os anticorpos gerados por uma infecção prévia ou pela vacina não consigam se ligar de forma eficiente a estes vírus e neutralizar a sua ação, causando o chamado escape imunológico. Vale lembrar que as principais vacinas adotadas mundialmente são produzidas contra esta proteína Spike. Uma possível consequência é uma ação ineficiente da vacina e a possibilidade de uma reinfecção por parte das pessoas.
Então as atuais vacinas não são eficazes contra as novas variantes do Brasil, Reino Unido e África do Sul? Calma! Por enquanto, é apenas uma especulação. Na verdade, ainda é cedo para afirmar, mas estudos preliminares apontam que são sim; os imunizantes foram capazes de gerar uma boa resposta imunológica às novas variantes, causando proteção contra o coronavírus. Mas mais estudos são exigidos e estão em curso.
Mas é importante ressaltar que o surgimento de novas variantes está diretamente relacionado à velocidade com que o vírus circula em uma população. Portanto, é fundamental manter as medidas de contenção do vírus, além de um programa de vacinação eficaz e ágil, se não quisermos ver uma explosão de novas variantes capazes de escapar da neutralização dos anticorpos e agravar dramaticamente a pandemia.
Para finalizar, uma curiosidade… lembrando que uma proteína é uma longa sequência de aminoácidos, o nome das mutações identifica as alterações que ocorreram e em que posição, como se fossem coordenadas. Por exemplo, a mutação E484K significa que, na posição 484, o aminoácido representado pela letra E (ácido glutâmico) foi substituído pelo aminoácido representado pela letra K (lisina). Agora fez mais sentido, né?!
Um beijo, com um desejo de que sejamos mais conscientes e sigamos esperançosos por dias melhores. 😊
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