Nova onda do coronavírus e os desafios em escala mundial 


coronavírus

Já conversei aqui sobre as variantes do novo coronavírus e como elas aparecem. E não era difícil imaginar o surgimento breve de uma que fosse responsável por uma nova onda de infecções. 

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Em novembro, cientistas da África do Sul identificaram uma variante do vírus Sars-Cov-2, até então desconhecida, e divulgaram imediatamente à comunidade científica mundial. Rapidamente, ela foi considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como preocupante e batizada por Ômicron, a 15ª letra do alfabeto grego. Juntamente às variantes Alfa, Beta, Gama e Delta, ela entrou na lista de Variantes de Preocupação (VOC, Variants Of Concern, em inglês).

A Ômicron é a variante com o maior número de mutações significativas detectadas até agora, com aproximadamente 50 mutações, sendo pouco mais de 30 delas na proteína S (Spike), a principal responsável por penetrar na célula humana. Dessas, algumas têm a propriedade de aumentar o potencial de infectividade e de transmissibilidade do vírus, ou seja, mais facilmente ele consegue entrar nas células humanas, se replicar, aumentar a sua carga viral e ajudar na transmissão de uma pessoa para a outra.

As mutações ocorrem ao acaso e fazem parte da evolução natural dos vírus. Quando elas oferecem alguma vantagem seletiva, esses vírus conseguem se espalhar de forma mais rápida e eficiente, tornando-se uma variante em potencial para tornar-se dominante.

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E foi exatamente o que aconteceu com a Ômicron. A explosão de casos desde dezembro passado tem levado o mundo a bater recordes diários de pessoas positivas para Covid. Na primeira semana de janeiro deste ano, foram mais de 15 milhões de novos casos em todo o mundo. Para comparação, durante os dois primeiros anos de pandemia, o recorde foi de 5 milhões de novas infecções em uma semana, em abril de 2021. Não há dúvidas de que a nova variante impôs novos desafios.

No Brasil, não seria diferente. Vivemos, no fim do ano passado e início desse, uma onda silenciosa e acentuada de infecções pela Ômicron e não nos demos conta. A maior capacidade de transmissão dessa variante, as aglomerações e festas de final de ano, juntamente com a fragilidade no nosso sistema de notificação, testes e rastreio de contactantes reforçaram este cenário.  E hoje, os brasileiros de todas as regiões enfrentam longas filas em laboratórios e unidades de saúde em busca de testagem para Covid. A falta de testes nas redes pública e privada já pode ser sentida em muitas cidades.

    Segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), o Brasil registrou nesta quarta-feira, 19 de janeiro de 2022, 204.854 mil novos casos de Covid-19, em 24 horas. Atingiu a média móvel (a média dos casos registrados nos últimos sete dias) de 99.974 infecções, a maior desde o começo da pandemia, pelos registros do Conass. A maior média móvel até então tinha sido em 24 de junho de 2021, com 77.328 casos.

    E sabemos que esses dados podem ser subnotificados, considerando as deficiências no processo de notificação que temos no país e a falta de política pública de testagem, isolamento de casos positivos e rastreamento de contatos, como mencionados acima.

    Mas, nem todas as notícias têm sido ruins. Estudos científicos preliminares sobre a Ômicron indicam que, apesar de mais transmissível, essa variante se mostra menos severa que as anteriores, especialmente entre os já vacinados. Muito provavelmente, devido a um conjunto de situações, como características do vírus após mutações, proteção dada pelas vacinas e pela imunidade natural. Há evidências de que a Ômicron tem menos propensão a infectar o trato respiratório baixo, como as células do pulmão.

    Outras características observadas estão relacionadas aos sintomas e períodos de incubação e de transmissibilidade. A incubação corresponde ao tempo que vai desde a exposição ao vírus até o aparecimento dos primeiros sintomas; e já existem algumas evidências de que o período de incubação da Ômicron é menor. Apesar dos sintomas poderem aparecer até 14 dias após a infecção, normalmente isso acontecia após 5 ou 6 dias com as primeiras variantes do Sars-CoV-2 e após 4 dias com a Delta. Com a nova variante, o período médio de incubação tem ficado em 2 a 3 dias.

    Os principais sintomas a serem relatados com a nova variante são: dor de garganta, secreção nasal, dor de cabeça, fadiga, febre baixa e espirro. Sintomas muito semelhantes à gripe ou resfriado. Aliás, diante da epidemia pelo vírus da gripe H3N2 aqui no Brasil, simultaneamente à nova onda de Covid-19, muitas pessoas com estes sintomas não reconheceram a possibilidade de infecção como Covid, não se isolando e fortalecendo a cadeia de transmissão da Ômicron.  

    Acredita-se que a transmissão viral pode ocorrer até 3 dias após o aparecimento dos sintomas, contabilizando apenas uma média de 7 dias em que a nova variante permanece no organismo humano. Esse período de infecção mais curto levou vários países a modificarem o seu protocolo e reduzirem o tempo de isolamento das pessoas com Covid, desde que não  mais apresentem sintomas.

    Nos EUA, por exemplo, o isolamento passou de 10 para 5 dias; e no Reino Unido, de 10 para 7 dias, após dois testes de antígeno negativos.

No Brasil, o Ministério da Saúde estabeleceu que o período mínimo de isolamento passa a ser de 7 dias, desde que sem sintomas nas últimas 24 horas. É possível sair do isolamento antes em caso de resultado negativo no teste RT-PCR ou de antígeno no 5º dia de sintomas, mas com o condicionante de não apresentar nenhum sintoma há pelo menos 24 horas. Em caso desse resultado ser positivo, é necessário manter o isolamento por 10 dias a partir do início dos sintomas.

    A velocidade de transmissão da variante é surpreendente e, apesar de menos patogênica, ela continua oferecendo riscos de hospitalizações e óbitos, sobretudo para aqueles com comorbidades e para os que não se vacinaram ou estão com a vacinação incompleta.

    O grande impacto, hoje, desse “tsunami” chamado Ômicron é o afastamento de um grande número de profissionais da saúde em hospitais, prontos-socorros e clínicas médicas, gerando uma expectativa de uma pressão sobre o sistema hospitalar público e privado. Além de uma possível necessidade de abertura de novos leitos, sobretudo de enfermaria, com atenção especial à pediatria.

    No entanto, com o avanço da cobertura vacinal, o grande número de pessoas positivas para Covid e com sintomas mais leves, é difícil imaginar que viveremos o caos de superlotação de leitos e falta de insumos que levou nosso sistema de saúde ao colapso em muitos estados brasileiros nos anos de 2020 e 2021.

    A realidade que o mundo está vivendo veio gritar a necessidade de se olhar para a enorme desigualdade global na distribuição de vacinas entre os países, principalmente os de baixa renda. Enquanto não houver uma proteção vacinal mundial homogênea contra o Sars-CoV-2, o vírus continuará circulando livremente nas populações mais vulneráveis, em que as taxas de vacinação são baixíssimas, e estaremos suscetíveis ao surgimento de novas variantes capazes de provocar novas ondas.

    Enquanto isso não acontece, a tendência é que vivamos com restrições e liberações das medidas de controle da pandemia, dependendo do cenário epidemiológico regional. 

    Há esperanças de que 2022 seja o início do fim da pandemia… o que não quer dizer que o novo coronavírus será extinto ou deixará de ser um problema de saúde. Certamente, ele ainda estará presente entre nós, como uma doença endêmica e de impacto relevante nos sistemas de saúde. Mas se tornará uma doença mais previsível se corretamente monitorada.

    É muito provável que tenhamos vacinações anuais, assim como ocorre com a influenza, com um programa especial para os mais vulneráveis. Mas ainda precisamos de alguns meses para essas respostas.

    Para hoje, é manter a consciência do momento delicado em que vivemos, continuar com o uso de máscaras faciais, evitar aglomerações e locais fechados, testar para Covid-19 ao menor sintoma característico, manter distanciamento e seguir o plano de vacinação corretamente.

    E, mais uma vez, vale ressaltar a importância de boas políticas públicas de controle da pandemia, assim como o investimento em projetos e programas de conhecimento científico.

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Falando de Ciencia com Erika Klann

Olá, eu sou a Érika Klann, bióloga Geneticista pela UFRJ, professora, com mestrado em Virologia pela Fiocruz-RJ, apaixonada pelo universo da ciência e pesquisa.

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