Ainda não superei o impacto de Maid, a série da Netflix que coloca o dedo numa ferida necessária: relacionamentos abusivos. A cena inicial é uma amostra da carga emocional que norteia a série, com a protagonista Alex saindo da casa em que vive com o namorado, no meio da madrugada, carregando a filha, Maddy, uma mochila, 20 dólares e dirigindo sem rumo.
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A tensão e as incertezas desse momento me fizeram prender o fôlego, sentindo o desespero daquela mãe, cansada de viver no limite, entre xingamentos e murros na parede desferidos por quem, um dia, arrebatou o coração dela.
Maid começa assim, te jogando uma realidade cada vez mais comum na cara, com uma mulher despedaçada que precisa sobreviver e proteger a filha. Sem ter onde morar e nem trabalho, Alex cai no sistema assistencial americano e sente na pele a dificuldade até de usufruir de alguns recursos básicos, como auxílio creche.
Tem dificuldade de se reconhecer como vítima de um relacionamento abusivo, pois a violência que sofria não deixava marcas na pele, visíveis. Deveria ter chamado a polícia a cada objeto arremessado em sua direção, mas que não a atingiram?
Enquanto Alex tenta se qualificar pra ser inserida no sistema de benefícios assistenciais, precisa encarar situações dolorosas e trágicas, como uma batida que destruiu seu carro, não ter onde dormir e a escolha entre comer e comprar produtos de limpeza pra começar o trabalho como faxineira.
Ela aceita o trabalho, pois não se qualifica para outras funções e precisa de dinheiro na hora. É aí que começa a sua história com a vida de faxineira, o que rendeu o reconhecimento e sucesso de Stephanie Land, a Alex da vida real e autora do livro que inspirou a série.
Essa vertente mostra o quão invisível é o trabalho de faxineira nos Estados Unidos, a ponto de desmaiar de fome em sua primeira faxina. Sei que no Brasil o trabalho doméstico também é mal remunerado e muitos que o fazem são tratados como a Alex ou pior. Uma outra crítica social marcante em Maid.
O martírio de Alex está apenas começando, ela ainda precisa lidar com a mãe bipolar, o pai ausente e com histórico de violência doméstica, o namorado que ameaça tirar a guarda da filha e uma colega de trabalho que se aproveita da sua boa vontade.
É triste saber que a realidade é bem pior e que muitas pessoas podem querer ajudar, mas com segundas intenções, como um amigo que surge na história. O quanto uma mãe suporta para proteger o filho e dar o melhor que pode? Maid mostra que não há limites para isso, mas o preço é alto.
As cenas chegam a traduzir o sentimento de Alex, em certo ponto que ela, sem opção, volta pra casa do namorado e começa a entrar no buraco negro e assustador da depressão. Ela é engolida pelo sofá, numa tradução daquele sensação de quando a gente, num momento de tristeza e apatia, entrega os pontos.
Mas Alex é jovem, talentosa para escrever e tem o sonho de cursar uma faculdade. É o lado esperança da série, que te faz pensar: calma, vai valer a pena! E tudo isso na interpretação impecável e totalmente entregue de Margareth Qualley, que divide a cena com sua mãe na vida real, Andie MacDowell, a mãe hippie de Alex.
É difícil dizer o que mais me prendeu em Maid. Tudo é ambientado no frio do Alasca, entre uma travessia de balsa, um quarto de abrigo para vítimas de violência e a busca por uma vida digna.
Acho que todas as pessoas deveriam assistir Maid, como um alerta para entender que não é normal sentir medo de quem se diz parceiro, não é normal ser diminuída por ser mulher, não é normal ter o dinheiro controlado por outro, não é normal perder a vontade de sonhar e até de viver. Pode não ser você, mas pode ser alguém que você conheça.
E, quem sabe, a gente tenha chance de falar pra essa mulher, assim como Alex ouviu: calma, agora você pode respirar.
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Nossa que relato impressionante Fabiana. São tantas Maid da vida real no mundo inteiro que se pudermos ajudar uma já seria fantástico e com certeza conhecemos várias e muitas vezes não nos damos conta e nem percebemos o sofrimento e angústia de muitas mulheres que estão tão perto de nós e ao mesmo tempo tão distante.